quinta-feira, 10 de outubro de 2013

escape


pudesse viver a par do belo,
mesmo o belo das pequenas coisas:
o sorriso, o sol, a lua,
a beleza desenhada dos teus traços numa tela.
Contudo, por certo, o tédio chegaria,
porque é da natureza o enfado
com o que é habitual e assim,comum.
pudesse viver a par do belo
até não querer mais a tua beleza...
bom escape seria para a tristeza
do feio destes dias.

segunda-feira, 24 de junho de 2013

beijo


beijo a tua boca devagar
os teus lábios macios
que provo como à polpa de um fruto fresco

prendo entre os meus dentes
os teus lábios
um pouco dessa carne quente e húmida
a tua língua

sinto a textura
mas perco-me no que sinto
porque num beijo posso deixar de existir

segunda-feira, 22 de abril de 2013

regressar



no cimo da montanha está o mesmo sol,
mas o sonho desfez-se nas águas do rio.
calmo, brilhante e fresco, ele desliza pelo leito
de areia e lage polidas
como um corpo à mercê de mãos que o vão moldando com carícias


não vale a pena dizer que lamento todas as lágrimas.
elas tinham de ser choradas, secar na tua pele,
temperá-la com o sal da tristeza.
no fim são sempre lágrimas e tristeza por companhia

e as estações passam e partimos ambos.
por vezes regressamos a partes de nós, aqui
(mas nunca é a mesma coisa).
apenas ficaram sombras.
regressamos

segunda-feira, 15 de abril de 2013

decisão






já não vou revelar os meus segredos
os teus pés caminham sobre gelo frio
eu sou objecto vazio à espera de novo uso
quando adivinhaste?

quarta-feira, 20 de fevereiro de 2013

sob cerco


http://youtu.be/TFgMeUExZBg


Um acontecimento principal concorre para este texto: o facto do ministro Miguel Relvas ter sido impedido de falar num evento público no ISCTE.

Vi uma reportagem televisiva sobre o que aconteceu. Mostrava a veemência dos manifestantes que impediram o ministro de falar e a forma como acabou por ser retirado das instalações da Universidade, sob protecção musculada e debaixo de um coro de protestos e enxovalhos. Comentei no facebook o vídeo e escrevi a primeira ideia que me surgiu: já ninguém quer ouvir o que têm para dizer.

Com efeito, creio que um segmento significativo da sociedade portuguesa já não acredita, nem tem paciência para o que este governo e os seus representantes exprimem, certos de que a seguir vão sofrer na pele as medidas draconianas que, sob a justificação da situação do país, acabam por ser impostas.

Acredito no princípio da legitimidade democrática de um governo que resulta de eleições livres. Eleições a que os partidos submetem um programa que é sufragado pelo povo. Acredito que pelo período instituído esse governo deve promover as suas políticas no respeito das “promessas” ou intenções submetidas ao escrutínio dos cidadãos. Assim, acredito na liberdade de expressão de todos e assim, também, acredito que ao ministro devia ter sido dada oportunidade de falar.

A questão é que este governo de uma forma mais ostensiva que os anteriores, não tem cumprido as suas promessas e tem, das mais variadas formas, concorrido para um empobrecimento generalizado do país, das famílias, para um aumento do desemprego, da insatisfação, da injustiça social e do sentimento de “fim de linha”. Este governo parece estar a ir muito além das propostas que submeteu a sufrágio e por isso coloco-me a questão da permanência, hoje, da sua legitimidade governativa. Existindo uma questão de forma e de conteúdo, diria que se formalmente está legitimado, quanto ao conteúdo perdeu a legitimidade.

Na TSF o Professor José Gil comentava, esta manhã, o episódio do ISCTE, alertando para o perigo destes pequenos movimentos que brotam de forma mais ou menos organizada e que catalisam os sentimentos das massas. Alertou para o facto de serem sintomas da inquietação que a sociedade Portuguesa vive. A ideia que me ficou impressa foi a de um governo, em particular, e de uma classe política, em geral, “sob cerco”.

No Parlamento, de tarde, o líder da bancada parlamentar do PSD repudiou os acontecimentos. O Parlamento não foi unânime em condenar o sucedido, a oposição tentou tirar dividendos e não foi debatida a questão de fundo.

Ao início da noite, no programa Pares da República da TSF, Maria de Lurdes Rodrigues, ex-ministra da Educação da era Sócrates, lamentava o sucedido, referia que se trata de situações que não devem, não podem acontecer e que exigem medidas preventivas. Não esclareceu que tipo de medidas…

O exercício do contraditório e a liberdade de expressão são essenciais na vida democrática, contudo as acções de protesto e repúdio também são. Os políticos têm vários fóruns onde podem expor livremente as suas ideias, por exemplo, o Parlamento, onde qualquer cidadão que esteja a assistir não pode manifestar-se ou será retirado das bancadas. Foi o que aconteceu às pessoas que cantaram Grândola Vila Morena e assim, interromperam o Primeiro ministro.

Os governos e os políticos devem servir o Povo. Existe um contracto assinado no dia das eleições entre governantes e governados que deve ser honrado. Quando esse contracto não é honrado, há falta de respeito. Quando há falta de respeito começam a surgir sinais de que o poder está “sob cerco”.

quinta-feira, 24 de janeiro de 2013

Raiva


toda a raiva é branca
toda a noite pensei que a raiva é branca
um manto glauco que se abate e consome
o arco-íris de cor de que sou feito


e o corpo explode de frustração
porque a consciência impede
que a mesma se perca
e a ignorância se instale

pudesse eu vazar todo o entulho de que estou cheio
e para tanto ver na escuridão